(Xime-Mansambo,
1972/1974)
com data de 25OUT2013.
Caríssimo Camarada
Sousa de Castro.
Os meus melhores
cumprimentos.
Por ter tido acesso ao
espólio de documentos [comunicados mensais] elaborados pelo PAIGC, em depósito
na Fundação Mário Soares, sobre as suas actividades de guerrilha desenvolvidas
contra as NT, em particular as que envolveram o contingente da CART 3494,
constatei a existência de significativas diferenças numéricas quanto aos
resultados obtidos, nomeadamente os que se referem à 1.ª emboscada na
Ponta Coli, em 22.Abr.1972.
No sentido de contribuir
para a maior aproximação à verdade dos factos [qualitativa e quantitativa], não
me restava outra alternativa senão torná-los públicos, deixando ao cuidado do
leitor a sua interpretação.
Eis, então,
mais um modesto contributo a incluir no baú de memórias da CART 3494
(1971/74).
Obrigado pela atenção.
Um forte abraço para
todos.
Jorge Araújo.
Outubro/2013.
(XIME-BAMBADINCA) –
1972
- A verdade dos
números -
Esta
segurança era organizada num «ponto X», dito estratégico, na Estrada
Xime-Bambadinca [ver mapa], estrada que tinha o seu início/fim no Cais do Xime
e que era a única via que dava acesso ao extremo leste do território, de que
são exemplos as localidades de: Bafatá, Nova Lamego, Piche, Canquelifá,
Galomaro, Mansambo, Xitole, Saltinho, entre outras.
Pelo elevado grau de dificuldade, a que
se adiciona o historial de confrontos com os guerrilheiros do PAIGC anteriores
à nossa companhia, como são os sucessivos exemplos da CCAÇ 1550
(1966/68), CART 1746 (1967/69), CART 2520 (1969/70) e CART
2715 (1970/72), cada segurança diária na Ponta Coli era sempre uma acção/missão
única, dando lugar continuamente a novos desafios, por estar carregada de interrogações
onde emergia o conceito «surpresa», principal característica na guerra de
guerrilha.
Por esse motivo, e em função das inúmeras
experiências que aí vivi (vivemos), decidi chamar-lhe: «palco de jogos de
sobrevivência», já que a única regra desse “jogo” era a eliminação física
do opositor ou dos opositores por antecipação e perícia, independentemente dos
argumentos e motivações que a cada qual pudessem assistir, à época.
Para identificação desse «palco»
e caracterização do seu contexto, eis algumas imagens:
Foto 1 – Xime (Ponta Coli - Maio/1972) – Espaço onde se concentravam e distribuíam os nossos militares em serviço de segurança à estrada Xime-Bambadinca |
Foi
exactamente neste local que um bigrupo do PAIGC, comandado muito provavelmente
por Mário Mendes, constituído por mais de cinco dezenas de guerrilheiros, se
instalou no dia 22.Abr.1972, sábado, e donde emboscou o nosso GComb.
O
baptismo de fogo (ao vivo e a cores) da CART 3494 aconteceu, assim, ao
trigésimo nono dia depois ter assumido na plenitude o controlo do seu
território de intervenção – o XIME –, na sequência de ter finalizado o
tempo de sobreposição com a CART 2715, do BART 2917 (1970/72), que decorreu
entre 28.Jan e 14.Mar.1972.
AK-47 conhecida por Kalashnicov |
Sabendo-se
que era um líder temido e um guerrilheiro experiente, conhecedor dos terrenos
que pisava e consciente dos riscos que corria, estas dimensões conjugadas não
foram suficientes para garantirem estar a salvo e sobreviver, mais uma vez, aos
muitos sustos que certamente apanhou ao longo dos anos que viveu no mato.
Depois
de alguns elementos (5/6) do seu grupo terem sido detectados pelas NT na acção
sobredita, e que não se sabia, naturalmente, de quem se tratava, um daqueles
elementos (Mário Mendes) liderou uma estratégia de fuga que não lhe foi, desta
vez, favorável, por via de lhe(s) ter sido movida perseguição, obrigando-nos a
serpentear várias vezes os mesmos trilhos, entre itinerários de vegetação e
clareiras.
Por
isso, estou crente que Mário Mendes, a partir do momento em que ficou sem rumo
certo e sem portas de saída, movimentando-se em várias direcções, sem sucesso,
tomou consciência de que aquele seria o último dia da sua vida. E foi, por
intervenção de elementos da CCAÇ 12.
Foto 4 – Xime
(Ponta Coli - Maio/1972) – O mesmo contexto e o mesmo tronco da árvore da
imagem anterior, agora num plano mais elevado.
|
Foto 5 – Xime
(Ponta Coli - Maio/1972) – O mesmo espaço anterior com a observação de um
«bagabaga», que funcionava como posto de vigia.
|
Sei [ou sabemos] que esses números,
agora que estão decorridos mais de quatro dezenas de anos, pouca relevância têm
entre nós, ou seja, não interessam nada. Porém, porque a eles estamos ligados,
importa, do ponto de vista histórico [que é a ciência dos factos reais],
corrigi-los, em nome da verdade por oposição à ficção.
Para o efeito, foi consultada a História
da Unidade do BART 3873, em particular a da companhia CART 3494,
bem como o arquivo Amílcar Cabral disponível na Net com o endereço http://casacomum.org/cc,
pertença do Arquivo & Biblioteca da Fundação Mário Soares, em contra ponto
com o que observámos nesse contexto.
1.
– EMBOSCADA DE 22 DE ABRIL DE 1972 – Os
números
a) – O
que aconteceu …
Naquele dia, o grupo escalado para
cumprir a missão de efectuar a segurança à Ponta Coli era o 4.º GComb,
constituído por vinte operacionais, entre sargentos e praças, uma vez que não
havia nenhum oficial adstrito, e mais dois condutores e um Guia, no caso o
Malan, o que totalizava vinte e três elementos.
Estes elementos seguiram em duas
viaturas [12+11] Unimog.
Na sequência do confronto, o balanço da
primeira emboscada sofrida pela CART 3494 foi de um morto, o camarada
furriel Manuel Rocha Bento [a única baixa em combate ao longo dos mais de vinte
e sete meses de comissão], dezassete feridos entre graves e menos graves, e,
por exclusão de partes, cinco dos militares saíram ilesos, sendo eu um deles.
b)
– O que consta na História da Unidade –
BART 3873
- Em 220600ABR72 grupo IN emboscou a
segurança da PTA COLI (01 GRCOMB da CART 3494). As NT e a Artilharia do XIME
pôs [puseram] o IN em fuga. Sofremos 01 morto (Furriel), 07 feridos graves e 12
feridos ligeiros [p.59].
c)
– O que consta no Comunicado do PAIGC
sobre as acções militares do mês de Abril (1972)
Transcrição do comunicado do PAIGC em língua francesa, sobre as acções militares do mês de
Abril (1972) e assinado por Amílcar Cabral.
Tradução do parágrafo em que é referida a emboscada à Ponta Coli.
Tradução do parágrafo em que é referida a emboscada à Ponta Coli.
(…)
“As emboscadas mais mortíferas para o
inimigo foram as que ocorreram nos itinerários do Saltinho/Kirafo [CCAÇ
3490/BCAÇ 3872 - 72/74*] (a 17 de Abril, 2 viaturas destruídas, 20 mortos e
vários feridos) e a do Xime/Bambadinca (a 22 de Abril, 4 viaturas destruídas
e 12 mortos).”
(…)
Data: 8 Junho 1972
Amílcar Cabral
Secretário Geral
Fonte:
Pasta:
07/197.160.014
Título:
Comunicado do PAIGC sobre as acções militares do mês de Abril
Assunto:
Comunicado do PAIGC sobre as acções militares do mês de Abril (66 operações),
com destaque para o ataque a Mansoa e Bolama. Denuncia a destruição de escolas,
hospitais e vilas, a utilização de napalm e os bombardeamentos aéreos
efectuados pelo exército português. Comunicado assinado por Amílcar Cabral.
Data:
Quinta, 8 de Junho de 1972
Observações:
Doc. Incluído no dossier intitulado Documentos.
Fundo:
DAC - Documentos Amílcar Cabral
Tipo
Documental: Documentos
(*) – Blogue: Luís Graça & Camaradas da
Guiné
-
Vd. 22 de Março de 2009 » P4068: Recordando a tragédia do Quirafo, ocorrida nodia 17 de Abril de 1972 (Luís Dias) e O morto vivo do Quirafo (Cart 3494 & camaradas da Guiné)
– A VERDADE DOS NÚMEROS
Perante os elementos acima referidos, em
particular os oficiais: NT e PAIGC, deixo-os à V. consideração.
Espero que tenham ficado mais esclarecidos.
Um forte abraço para todos, com muita
saúde e energia.
Jorge Araújo.
Outubro/2013.