MSG com data de 25NOV2013 (IX) de Jorge Araújo ex. Fur. Milº OP.Esp./Ranger - CART 3494 do BART 3873 - Guiné DEC71/ABR74
Na sequência
das anteriores narrativas tendo por enquadramento histórico a «Ponta Coli»
[Postes; 148; 152 e 191], eis outra, agora referente à presença dos camaradas
militares da CART 3494 na «Ponte do Rio Udunduma».
Entre a
“Ponta…” e a “Ponte…” o que muda é a vogal, uma vez que a substância da nossa
missão era a mesma: «SEGURANÇA», mas em diferentes pontos [locais] na
Estrada Xime-Bambadinca, afastados, entre si, meia-dúzia de quilómetros.
Ora leiam e
comentem a 1.ª parte.
Obrigado.
Jorge Araújo.
Nov./2013.
GUINÉ
Jorge
Alves Araújo, ex-Furriel Mil. Op. Esp./RANGER, CART 3494
O DESTACAMENTO DA
PONTE DO RIO UDUNDUMA
(XIME-BAMBADINCA)
1. A génese da segurança à
Ponte do Rio Udunduma
- Antecedentes históricos
A história diz-nos, enquanto memória de
um passado que continua presente, que a segurança à 1.ª Ponte [velhinha] do Rio
Udunduma, situada na Estrada Xime-Bambadinca, teve o seu início no dia 29 de
Maio de 1969, 5.ª feira, na sequência da dupla acção do PAIGC, levada a cabo na
noite do dia anterior (28/29.Mai69) por dois bigrupos (cerca de 100 elementos).
Essas duas acções tiveram como alvos o ataque ao Aquartelamento de Bambadinca,
sede, à época, do BCAÇ 2852 (1968/70), e, simultaneamente, à Ponte do Rio
Udunduma, situada a cerca de quatro quilómetros desta localidade, a qual foi
dinamitada, resultando desse acto ter ficado parcialmente danificada, conforme
se pode observar nas imagens a baixo.
Foto 1 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem de como ficou a
ponte velha na sequência da explosão de 28Mai1969, obtida ao nível do solo.
Foto 2 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem da ponte velha, obtida
da nova estrada onde foi construída uma nova ponte sobre o rio, inaugurada
entre finais de 1971 e início de 1972.
Os primeiros operacionais das NT a
avançar para esse local foram os do 3.º GComb da CART 2339 (1968/69), sedeada
em Mansambo, sob o comando do Furriel Carlos M. Santos (Vd Postes: 7459 e
7859)
Foto 3 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem da estrada velha, assinalando-se
a ponte semidestruída em 1969, e Bambadinca, ao fundo, como local mais próximo,
a quatro quilómetros desta. Na linha do horizonte, vê-se a nova estrada na qual
é possível contar uma coluna de mais de uma dezena de viaturas civis, em
direcção ao Cais do Xime.
Recuperado o controlo daquela pequena
fracção de terreno circunscrita ao afluente do Geba e da bolanha contígua, a
Ponte do Rio Udunduma, mesmo depois de ter ficado bastante danificada, não mais
voltou a estar/ficar desprotegida até ao fim da guerra de guerrilha
[Abril/1974], devido à decisão de aí se instalar uma força militar [especial]
que, com o decorrer do tempo, haveria de dar lugar à organização de um
Destacamento [amostra de… ou mini…].
Entretanto, uma nova ponte haveria de
ser construída a seu lado, a poucas dezenas de metros, maior e perfeitamente
adequada ao grande fluxo rodoviário, civil e militar, que diariamente circulava
nesta estrada, com ligação a toda a zona leste do território, com maior
destaque para as localidades de Bafatá, Nova Lamego, Piche, Canquelifá,
Galomaro e Saltinho. Segundo julgo saber, a sua construção esteve a cargo da
empresa Tecnil, e a sua inauguração deverá ter ocorrido entre finais de 1971 e
início de 1972.
Foto 4 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem da nova ponte
construída pela empresa Tecnil. Ela foi obtida da ponte velha.
Durante cinco anos, muitos foram os
camaradas que aí permaneceram vigilantes, num contexto desprovido de qualquer
rectaguarda de apoio militar, em que cada um de nós estava completamente
abandonado à sorte da divina providência e à sua couraça, tendo como mais-valia
a capacidade de sobrevivência, pois se tivesse acontecido algum ataque, ele
seria sempre de surpresa, e, por esse método, nem os peixinhos se salvavam. Em
suma: miserável e degradante, já que não tinha rigorosamente nada. Ou melhor,
tinha o que as imagens abaixo deixam entender.
Foto 5 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma – Jul/1973] – imagem de um buraco aberto
no chão, coberto de troncos de palmeira, terra e chapas de zinco a cobri-los,
protegido no exterior com bidões de gasóleo cheios de terra, com uma pequena
abertura, tendo no seu interior uma cama de ferro, especial do mobiliário
militar, com colchão adequado …a um sono tranquilo [que enorme ironia].
A cama tinha um
mosquiteiro comprado em Bafatá, nas “libanesas”. Este acabaria por ter uma
dupla função, na medida em que, protegendo-nos dos mosquitos e das melgas,
servia também de cama elástica e/ou trampolim para treino de flexibilidade e
destreza dos ratos do mato que nos visitavam durante a noite, em sessões contínuas.
Para além desta actividade físico-desportiva em ginásio coberto, sem necessidade
de inscrição prévia ou celebração de contrato de fidelização, a equipa de
roedores ainda tinha a pouca vergonha de nos levar os sabonetes e as meias para
a sua comunidade, algures nas redondezas, certamente muito importante na sua higiene.
Era, então, um
contexto maravilhoso … e com muita animação.
Foto 6 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – o mesmo chalé T0 quatro anos antes,
com o camarada furriel Humberto Reis, do 2.º GComb da CCAÇ 12, em momento de
reflexão (P7481-LG), aguardando… talvez: a passagem do carteiro? ou, ainda, uma
boleia para a metrópole? Mas… só ele nos poderá dizer!
Entre o tempo das fotos 5 e 6 [quatro
anos], outros camaradas por lá passaram de diversos Grupos de Combate
destacados das Unidades instaladas naquele Sector (L1), considerado um dos de
maior vastidão em todo o T.O., nomeadamente: CART 2339 (1969), de Mansambo –
CART 2520 [1969 - 2 secções], do Xime – C.CAÇ 12 [1969-71], de Bambadinca – PEL
CAÇ NAT 52 [1972] – PEL CAÇ NAT 63 [Out/1972] – CART 3493 [Mar/1973 - 2 secções],
de Mansambo – CART 3494 [Abr/1973-74 - 1 secção +], de Mansambo-Xime.
2. As
acções especiais durante o 2.º semestre de 1973
Com a transferência do Xime para
Mansambo, ocorrida nos primeiros dias de Março de 1973, a CART 3494, através
dos seus diferentes GComb, passou a ter uma agenda e missões muito distintas
das que tinha tido anteriormente no Xime, o que é perfeitamente natural e
normal, pois não havia [não há] dois contextos iguais.
No nosso caso, foi-nos atribuída mais uma
missão especial: a de comandar uma secção + do meu pelotão [o 1.º], num total
de doze elementos, com o objectivo de proteger a(s) Ponte(s) do Rio Udunduma,
actividade que registava já quatro anos.
Avançámos com armas e [poucas] bagagens,
na medida em que as condições logísticas e físicas do local eram incrivelmente
pouco dignas e, por essa razão, um desafio permanente à superação de qualquer
ser mortal.
Não havia nada … mas mesmo nada … com
excepção de capim, três buracos no chão, muitos mosquitos e alguns ratos, conforme
relatos anteriores. Electricidade cá tem. Água cá tem. Comida cá
tem. Mas criatividade e improvisação… muita.
Dois petromax e a claridade da lua; alguns
lustres de garrafas de cerveja; poucas velas de cera, reforçadas com meia-dúzia
de isqueiros [os dos fumadores], era esta a panóplia de instrumentos que
iluminavam os nossos olhos e ideias e aqueciam, simultaneamente, os nossos
corações, durante as noites. Mas, como o ser humano é um ser de assimilação e
de acomodação [tal como se verifica nos tempos de hoje], as semanas e os meses
lá foram passando ao ritmo de… um dia de cada vez.
Esse ano de 1973 foi um ano muito duro
para todos nós, militares no CTIG. E no local da Ponte do Rio Udunduma não foi
diferente ou excepção. As orientações recebidas dos meus superiores, em
particular do comando da CCS, de quem o “grupo especial” dependia
logisticamente, assentavam num dualismo cartesiano [de René Descartes,
1596-1650], construídas na ideia de que de dia era para trabalhar, à noite era
para estar vigilante. Enfim … já passaram quarenta anos.
Como não fomos para a Guiné em viagem de
turismo, as alternativas eram escassas ou quase nulas, pelo que, a bem da
defesa pessoal e da melhoria das condições de vida naquele contexto, lá metemos
as mãos à(s) obra(s), levando-nos a alterar, significativamente, a sua paisagem
por via de algumas benfeitorias.
Dito isto, passaremos em revista três
dessas acções especiais, organizadas por fases, e que completam a primeira parte
desta história da nossa vida colectiva.
A) – FECHO DO
CONDOMÍNIO …
Fotos 7 e 8 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – a primeira acção especial
desenvolvida por elementos do 1.º GComb, da Cart 3494 [um grupo constituído por
uma dúzia de militares = a 1 secção +], foi a delimitação do território,
do então designado «Destacamento da Ponte», ou, ainda, por «Condomínio da
Ponte». Merece relevo a elevada capacidade técnica de todos os seus
executantes. [O 1.º, na foto 8, é o soldado Joaquim Cerqueira, do lugar da
Valinha - Amarante].
Tratou-se de
uma experiência de alto valor pedagógico, na justa medida em que fez apelo à
motricidade fina do efectivo aí residente, por via de não existirem protecções
das mãos, vulgo luvas, na manipulação do arame farpado. De referir, que esta
acção aconteceu na época das chuvas.
B) – CONSTRUÇÃO DE
NOVAS MORADIAS …
Fotos 9 e 10 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – as imagens dão conta do modelo de
arquitectura da nova moradia T1. Era rectangular, com duas águas, e tinha dois
quartos e uma sala de jantar, mas não havia comer. Os alimentos, confeccionados
em Bambadinca, na CCS, chegava-nos às diferentes horas do dia, segundo a
sequência das refeições.
O edifício foi
construído junto ao caminho da “estrada antiga” [picada].
Como estará
hoje?
C) – CONSTRUÇÃO DA “ROTUNDA
DA PONTE” – A 1.ª NO MATO …
Fotos 11 e 12 – Estrada Xime-Bambadinca [Ponte do Rio
Udunduma] – as imagens referem-se à «Rotunda da Ponte» que decidimos construir
[sem projecto, logo sem aprovação autárquica] como ícone da CART 3494, através
da reprodução do seu símbolo. Para a sua construção foi utilizado o cimento
sobrante da moradia e as pedras foram retiradas dos espaços envolventes da nova
ponte. Para sinalizar a aproximação à rotunda foi pintada a base [disco] de um
bidão de gasóleo com “obrigatório circular” e colocado em local visível, na
extremidade de um tubo de ferro. Como curiosidade, todos os veículos que por lá
passavam [em particular o jipe do CMDT OP do BART 3873], os seus condutores
cumpriam o código da estrada.
D) – INSTALAÇÕES DE
APOIO …
Foto 13 – Estrada
Xime-Bambadinca [Ponte do Rio Udunduma] – imagem referente às óptimas condições
higiénicas do aldeamento … de muitas estrelas … sobretudo nas noites de luar.
É possível,
ainda, observar os nossos animais da/de companhia, em processo de socialização…
e de solidariedade.
Com esta
imagem, damos por concluída a primeira parte da história referente à nossa
passagem pela Ponte do Rio Udunduma – 2.º semestre de 1973.
Espero que
tenham gostado de a ler, independentemente de aqui e ali ter utilizado alguma
ironia e imagens metafóricas, e de ver as imagens seleccionadas.
Como
complemento, acredito que a narrativa tenha servido, quiçá, como elemento de recordação
de outras memórias de muitos de Vós, que por lá passaram, e que ainda estamos a
tempo de dar conta neste espaço de partilha que é o nosso blogue.
Aguardo.
Um forte abraço para todos os Fantasmas
do Xime, com muita saúde e energia.
Jorge Araújo.
2 comentários:
Estive na Ponte do Udunduma com o Pel Caç Nat 52, se bem me lembro, de Agosto de 72? a Talvez Novembro de 72, altura em que fui para o Mato Cão.
As instalações eram inqualificáveis, se me não falha a memória.
O vosso convívio este ano vai ser perto de minha casa motivo pelo qual se calhar e se me quiserem aceitar e eu puder, estarei convosco.
Um abraço
Joaquim Mexia Alves
Olá Mexia Alves,
É claro que te aceitamos com muito gosto, afinal pertences à mesma família, por outro lado quero lembrar, o António Bonito já o fez, deves ter em conta a data do encontro da Tabanca Grande por forma a não coincidir com o nosso dia.
Um abraço,
Sousa de Castro
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