Mensagem do nosso camarigo, Antero Francisco Carvalho dos Santos, residente na Vila de Avintes, ex. Fur. Milº atirador, minas e armadilhas, esteve na Guiné ao serviço do Estado Português desde Março72 a Junho de 1974, pertenceu à CCAÇ 3566, EMPADA - Março a Dezembro de 1972 e CCAÇ 18, ALDEIA FORMOSA - Janeiro 1973 a Junho de 1974.
SC
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Antero em Aldeia Formosa |
No dia 20 de Fevereiro de 1972, no Batalhão de Caçadores 10,
em Chaves, recebi a notícia de que havia sido mobilizado para a Guiné; iria
fazer parte da CCAÇ 3566 – Companhia de Caçadores 3566, e tinha como destino a
povoação de Empada. A Companhia adoptou o nome “OS METRALHAS”. Foi nomeado comandante da
Companhia, o Capitão Miliciano João Rocheta Rua.
No dia 22 de Março de 1972, por volta das onze horas da
noite, em autocarros da Auto-Viação do Tâmega, a CCAÇ 3566 partiu de Chaves
rumo a Lisboa. Chegamos a Lisboa, ao Aeroporto Militar de Figo Maduro, por
volta das sete horas da manhã do dia 23 e às duas da tarde partimos para
Bissau.
Depois de quatro horas de voo, chegamos a Bissau, ao
Aeroporto de Bissalanca, às catorze horas locais.
A primeira sensação que tive,
ainda no avião, quando sobrevoava a cidade, era de que só se via vegetação.
Depois de aterrar e quando saí do avião, senti um calor abrasador. Seguimos em
camiões militares para o quartel do Batalhão de Intendência.
Depois de instalados no Batalhão de Intendência aproveitamos
para visitar a cidade; ao fim da tarde regressamos ao quartel onde iríamos
passar esta noite; no dia seguinte seguiríamos para Bolama; aproveitei para me
deitar a fim de descansar um pouco e adormeci; em determinada altura sou
acordado e olhando para o indivíduo que me acordou, pergunto:
“Então Rocha, ainda há tão pouco tempo foste para a Guiné e
já cá estás de férias?”
Tratava-se do José Rocha, filho do Jorge Arouca, de Aldeia
Nova, que era Furriel Miliciano no Batalhão de Serviço de Material e que sabia
que eu chegava naquele dia. O meu corpo já estava na Guiné mas a minha mente
ainda estava na Metrópole – confusão total dos meus neurónios.
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O meu
grupo de combate da CCAÇ 18 pronto para mais uma saída de dois dias |
Ficamos esta noite em Bissau e no dia 24 cada um de nós
recebeu duas rações de combate “tipo E20” para os dois dias seguintes (pequeno
almoço, almoço e jantar) e, de novo em camiões, seguimos para o cais de Bolola,
no Rio Geba, em Bissau onde chegamos às oito horas da manhã, hora para o
embarque na LDG - Lancha de Desembarque Grande - de nome ALFANGE –– para a ilha
de Bolama; o embarque acabou por acontecer somente às onzehoras e chegamos
somente ao fim da tarde a Bolama, já que a viagem demorou cerca de sete horas.
O atraso na hora de embarque não permitiu beneficiar da maré cheia e a viagem
não pôde ser efectuada pelo canal, pelo que se teve contornar toda a Ilha de
Bolama. Pelo canal, a viagem demoraria metade do tempo. Depois da chegada a
Bolama, ficamos instalados no CIM – Centro de Instrução Militar – com a
finalidade de fazer a IAO – (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional). A IAO
constava de actividades idênticas àquelas que iriam ser a realidade dos nossos
dias quando estivéssemos no mato. Fiz parte do 4º grupo de combate, comandado
pelo Alferes Magalhães (da Póvoa de Varzim) e de que faziam parte também os
Furriéis Milicianos Miguel Souto (de Cervos, Boticas) e Horácio Ferreira (da
Póvoa de Varzim). Durante este período, aconteceu o meu baptismo de fogo: a
cidade de Bolama foi alvo de um ataque do inimigo. Neste ataque o IN lançou
vários mísseis (foguetões de 122mm) mas não houve consequências para as NT
porque todos os mísseis falharam o alvo.
Depois deste dia 23
de Março de 1972 seguiram-se longos nove meses divididos por Bolama e Empada;
depois de frequentar um Estágio de Enquadramento em Unidades Africanas fui
destacado para uma Companhia Africana - a 4 de Janeiro de 1973 segui para a
CCAÇ 18, em Aldeia Formosa; foram os tempos mais difíceis - dezassete meses em
Aldeia Formosa, numa Companhia Africana; Aqui soube verdadeiramente o que foi
combater.
Na primeira ou
segunda semana de Junho/74 regressei a Empada para levantar dois campos de
minas (um total de quarenta e quatro minas) que havia montado na mata de
Cantora e em Caur de Cima, cerca de vinte e dois meses antes; procedi ao
levantamento de quarenta e duas minas; infelizmente duas das montadas em Caur
de Cima (povoação abandonada) haviam sido accionadas.
Regressei no dia 24
de Junho de 1974 depois de oitocentos e vinte e três dias na Guiné (com o
intervalo de trinta dias de férias em Fevereiro/Março de 1973).
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O regresso- 24 de Junho de 1974 - Aeroporto de Bissalanca - Bissau |
Para além da
experiência vivida e que apesar de tudo acabou por ser fantástica, dos
louvores, da Medalha Comemorativa das Campanhas de África - Guiné 72/74, do
“prémio anual” no valor de 150 euros/ano pelos 27 meses ao serviço da Pátria,
tenho de “conviver” diariamente com o maldito stress pós-traumático de guerra.
Mas a vida continua, com a consciência de que fiz o que a Pátria me pediu.
“Defendeste a Pátria,
cumpriste o teu dever; a Pátria foi ingrata, fez o que costuma fazer”. Padre António Vieira.
Antero Santos
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A
vermelho grosso as zonas que "palmilhei" à volta de Empada e à volta
de Aldeia Formosa. O percurso para Buba era feito de Berliet - as célebres
colunas de reabastecimento |