MSG com data de: 13 de Fevereiro de 2019
Passados cinquenta anos daquela que ficou gravada na historiografia da Guerra no CTIG como a tragédia da «Jangada de Ché-Che», que agora recordo, um outro acontecimento ocorrido na zona do «chão manjaco", em Capó, onde se registaram mais quatro baixas.
É pois em homenagem aos camaradas açorianos e madeirenses da
CCAÇ 2444 e CCAÇ 2446, que tombaram nesse dia 6 de Fevereiro de 1969, que aqui
deixo o meu testemunho.
Com um forte abraço de amizade,
Jorge Araújo.
GUINÉ
Jorge Alves Araújo,
ex-Furriel Mil. Op. Esp./RANGER, CART 3494
(Xime-Mansambo,
1972/1974)
HOMENAGEM AOS CAMARADAS AÇORIANOS E MADEIRENSES DA CCAÇ
2444 E CCAÇ 2446 QUE TOMBARAM EM CAPÓ
- UMA EFEMÉRIDE COM CINQUENTA ANOS - 6FEV1969/6FEV2019 -
1. -
INTRODUÇÃO
O
dia 6 de Fevereiro de há cinquenta anos [1969], uma quinta-feira, está
considerado na historiografia da Guerra do Ultramar, ou da Guerra Colonial, em
particular no CTIG, como uma das datas mais dramáticas vividas pelas Forças
Armadas Portuguesas, onde pereceram cinquenta e um militares, entre elementos
do contingente europeu e do recrutamento local.
No
caso do desastre da “Jangada de Ché-Che”,
na sequência da retirada das NT de Madina do Boé, envolvendo os camaradas da
CCAÇ 1790, com vinte e seis mortos, da CCAÇ 2405, com dezanove, e mais dois do
PMil 149, totalizando, assim, quarenta e sete elementos naufragados no Rio
Corubal.
Em
relação a essa narrativa postada como efeméride [P19473-LG] retenho o que
recordou o camarada José Martins sobre essa tragédia inesquecível afirmando ser
“uma data indelével para os combatentes
da Guiné e familiares dos militares que sucumbiram na catástrofe durante a
travessia do Rio Corubal”, ao mesmo tempo que referiu os seus nomes.
Porém,
esta não foi a única ocorrência, com baixas, registada nesse dia 6 de Fevereiro
de 1969. Uma outra aconteceu em Capó, situada na estrada entre Cacheu e Bachile,
envolvendo a CCAÇ 2444 (Açoriana) e a CCAÇ 2446 (Madeirense). Dos combates
travados com os guerrilheiros do PAIGC resultaram quatro baixas para as NT,
sendo três da Companhia Açoriana e uma da Companhia Madeirense.
Carta de Teixeira Pinto
(1961); Escala 1/50 mil). Posição relativa a Capó, na estrada entre Teixeira
Pinto - Churo - Bachile - Capó - Cacheu [P11219-LG, com a devida vénia].
No
sentido de lhe/lhes prestarmos, de igual modo, as devidas e sentidas homenagens
que aqui deixo um resumo histórico desses factos.
1. –
RESUMO HISTÓRICO DAS DUAS UNIDADES
2.1 – A COMPANHIA DE CAÇADORES
2444 (AÇORIANA)
Em 28Nov’68 seguiu para Bula e depois para Có, a fim
de efectuar treino operacional com a CCAÇ 2402, sob orientação do BCAV 1915, de
01Dez’68 a 23Dez’68 e seguidamente, na função de subunidade de reserva do
Comando-Chefe, reforçar aquele Batalhão de Cavalaria na actuação naquela zona
de missão.
Em 28Jan69 foi colocada em Cacheu, em reforço
temporário do CAOP, com vista à realização de acções de contra-penetração
naquela área (região), sendo então integrada no BCAV 1915 e depois no BCAÇ
2485, onde permaneceu até ser substituída pela CCAV 2487, em 29Mar69,
deslocando-se para Bissorã. [...] O embarque de regresso, por ter concluído a
sua comissão, aconteceu em 20Ago70, a bordo do navio “Carvalho Araújo”.
2.2 – A COMPANHIA DE CAÇADORES
2446 (MADEIRENSE)
Em 04Dez68, foi colocada em Cacheu, a fim de render
a CCAÇ 1681 e assumiu a responsabilidade do respectivo subsector em 07Dez68,
ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 2845, e depois do BCAV 2868,
com um pelotão destacado em Bachile, desde 29Nov68 a 24Abr69. […] O embarque de
regresso, por ter concluído a sua comissão, aconteceu em 01Out70, a bordo do
N/M “UÍGE”.
2.3 – AS OCORRÊNCIAS CONTADAS
POR AQUELES QUE PARTICIPARAM NA «OPERAÇÃO AQUILES I»
Instalado a partir de 27Jan69 em Teixeira
Pinto, o CAOP foi organizado para cumprir a missão de orientar as suas
actividades operacionais de modo a intensificar o esforço de aniquilamento
sistemático dos grupos inimigos que exerciam pressão directa sobre o «Chão
Manjaco», na região de Pecau-Churo-Caboiana-Pelundo-Jol.
Em função das missões atribuídas às diferentes
forças no terreno pelo comando do CAOP de Teixeira Pinto, no dia 6 de Fevereiro
de 1969 deu-se início à «Operação Aquiles
I», na qual participaram diversas Unidades, entre elas a CCAÇ 2444, a CCAÇ
2446 e a CCAÇ 2366, de Jolmete (1968/1970), dos camaradas Manuel Carvalho e
João Rebola (1945-2018) - P11384-LG.
Recupero, a esse propósito, as informações
dadas pelo camarada Manuel Carvalho (ex-fur mil da CCAÇ 2366, de Jolmete,
acerca das ocorrências com a CCAÇ 2444 (Açoriana) e com a CCAÇ 2446
(Madeirense):
“Em 6 de
Fevereiro de 1969, começou a «Op Aquiles I» que se prolongou até 14 seguinte.
Logo no primeiro dia, 6 de Fevereiro, a CCAÇ 2444 teve três mortos e um guia civil
e três feridos e a CCAÇ 2446 teve um morto e um ferido e o Pel Mil 130 quatro
feridos. Pela nossa parte, a CCAÇ 2366, julgo que tivemos um ferido e um dia
apanhámos um RPG2 e três armas, mas estávamos a ver que as munições não
chegavam para abrir caminho para o quartel.” (…) (P11219-LG).
Mortos da CCAÇ 2444 (Açoriana):
● Manuel de Amaral Carneiro; Fur. Inf.;
natural de São José, Ponta Delgada; solteiro.
● José Bento Pacheco Aveiro; Soldado; natural
de Nordeste, S. Miguel; casado.
● Manuel dos Santos Costa Almeida; Soldado; natural
de Arrifes, Ponta Delgada; solteiro.
Mortos da CCAÇ 2446 (Madeirense):
● Manuel Brás Catanho Ribeiro; 1.º Cabo; natural
de Ribeira Seca, Machico; solteiro.
Jolmete (Fev69) – O
Manuel Carvalho, o Dandi e o Martins na chegada da “Op. Aquiles I”, em que
apanharam o RPG2 e mais três armas. (Dandi, natural de Jol, no “Chão Manjaco”,
era capitão da companhia de milícias do Pelundo. Foi agraciado com a Cruz de
Guerra pelo Gen Spínola em 1972. Será fuzilado pelo PAIGC em 1975. [foto do
camarada Manuel Carvalho - P18989-LG - com a devida vénia].
Um outro depoimento é-nos dado pelo camarada
João Carlos Resendes Carreiro, ex-alf mil da CCAÇ 2444, a propósito da
efeméride dos quarenta anos [2009], publicada no «Correio dos Açores» e
repetida no blogue da «Tabanca» - P11209-LG.
Eis o que viu e sentiu naquele dia 6 de
Fevereiro de 1969:
“Faz
hoje 40 anos [agora, cinquenta] que
numa emboscada na Guiné, morreram os militares de saudosa memória do furriel
Manuel Carreiro (o Mani, filho do então Director do Diário dos Açores), o
soldado José Aveiro (do Nordeste) e o soldado Manuel Almeida (o triclinas do
Outeiro dos Arrifes).
Eram 7 horas da manhã, a luz do
dia já começava a aparecer, mas a densidade do nevoeiro (cacimbo) mal deixava
ver as palmeiras e restante vegetação à nossa volta.
Estávamos na zona de Capó, entre o Cacheu e Bachile, uma curva na
estrada, com bolanha dos dois lados. Uma rajada de metralhadora deu cobertura à
saída de uma bazucada que atingiu a zona do estômago do Mani, de uma maneira
fatal. O tiroteio entretanto prosseguiu, a minha espingarda [G3] foi atingida
de modo que o carregador ficou todo estilhaçado. O Graça, que ficou gravemente
ferido, começou a gritar que tinha a perna despachada, quando levantei a
cabeça, para ver o que se passava, uma rajada levantou o pó da estrada, qual
cena do Far West.
O furriel Mani e o José Aveiro eram do pelotão que eu comandava, como
alferes, faziam parte da 3.ª secção, que naquela hora estavam a passar para a
frente. Quando o meu pelotão ia na frente rodávamos de 2 em 2 horas de secção,
eu costumava ir na secção da frente, porém ainda não tinha dado tempo, eles
ainda estavam a passar. Só me recordo de estar deitado na valeta da estrada, no
meio do fumo da pólvora e cheiro a sangue que não vou esquecer nunca.
Passados 40 anos quero recordar aqui estre três jovens, de 22 anos [mais
um da CCAÇ 2446], que deram a vida pela pátria, a 6 de Fevereiro de 1969, a
cumprir o seu dever de cidadãos. (…) Tínhamos todos 22 anos, tão jovens, mas
que adultos que éramos assumíamos responsabilidades de gente adulta e madura.
Um dia ver-nos-emos, vocês não morreram, passaram a viver de outra
maneira!”
Ass. João Carlos Resendes Carreiro.
Relatório da «Operação Aquiles I»
publicado pelo CAOP em Teixeira Pinto, p187 – P11392-LG (Manuel Carvalho), com
a devida vénia.
Aos
camaradas que pereceram no Rio Corubal, na “jangada
de Ché-Che”, e aos que tombaram na região de Capó, no “Chão Manjaco” [Oio], agora recordada, aqui deixo a minha mais
sentida homenagem, extensiva às suas famílias.
Jorge Araújo.
12FEV2019
Sem comentários:
Enviar um comentário