Para concluir o dossier relacionado com algumas das memórias
da CCAÇ 508, nas quais se incluem a morte do seu CMDT Capitão Francisco
Meirelles, ocorrida na Ponta Varela (Xime), anexo a V (e última) Parte.
Com um grande abraço e votos de boa saúde.
Jorge Araújo.
GUINÉ
Jorge Alves Araújo,
ex-Furriel Mil. Op. Esp./RANGER, CART 3494
(Xime-Mansambo,
1972/1974)
A COMPANHIA DE CAÇADORES 508 [CCAÇ 508] - (1963-1965) E A
MORTE DO SEU CMDT CAP INF FRANCISCO MEIRELLES EM 03JUN1965 NA PONTA VARELA
- A ÚNICA BAIXA EM COMBATE DE UM CAPITÃO NO XIME -
V (e última) PARTE
1. -
INTRODUÇÃO
Para além dos
documentos consultados e das informações orais transmitidas, via telefone, por
alguns dos elementos desta Unidade, contámos com o precioso recurso do álbum do
condutor auto rodas da “508”, Cândido Paredes, actualmente a residir em Ponte
de Lima, do qual apresentaremos abaixo mais algumas imagens, e a quem nos
cumpre agradecer.
Daí que, neste
último fragmento, recuperaremos algumas das diferentes missões do Capitão
Francisco Meirelles, e da sua CCAÇ 508, durante os seus últimos três meses,
desde a chegada a Bambadinca, em Março de 1965, até ao fatídico dia da sua
morte. Seguir-se-ão as descrições de alguns factos e dos ambientes que os
envolveram, que tiveram como corolário a atribuição do seu nome à toponímia da
Cidade do Porto. A origem dessa decisão teve por contexto a reunião ordinária
da Câmara Municipal do Porto, realizada em 20 de Julho de 1965, onde foi
aprovada por unanimidade, em cerimónia pública, a proposta dirigida à Comissão
de Toponímia de dar o nome do Capitão Meirelles a uma das ruas ou praças da Foz
do Douro.
2. - SUBSÍDIOS HISTÓRICOS
DA COMPANHIA DE CAÇADORES 508 =
BISSORÃ - BARRO -
BIGENE - OLOSSATO - BISSAU - QUINHAMEL - BAMBADINCA - GALOMARO - PONTA DO
INGLÊS E XIME (1963-1965)
Foto 2 – Bissorã (1964)
- Grupo de militares da CCAÇ 508. [Foto do álbum de Cândido Paredes, com a
devida vénia] in: http://lugardoreal.com/imaxe/candido-paredes-e-camaradas-5
|
Quadro cronológico da presença da CCAÇ 508 por localidades
A
CCAÇ 508 chega a Bissau a 20Jul1963, sábado, a bordo do cargueiro “SOFALA”, sob
o comando, interino, do Alferes Augusto Teixeira Cardoso, onde se juntou o Cap
Mil Inf João Henriques de Almeida, o seu 1.º Cmdt. Cinco meses após o início do
conflito armado na região de Tite, a CCAÇ 508 assumiu a responsabilidade do
subsector de Bissorã, então criado, com GrComb destacados em Barro, até
23Dez63, e Bigene, até 26Dez63, ficando integrada no dispositivo e manobra do
BCAÇ 507 e, após remodelação daqueles sectores, no BCAÇ 512. Em 26Dez63, passou
a ter um GrComb destacado em Olossato.
Em
meados de Julho de 1964, chega a esta Companhia Independente o Capitão
Francisco Xavier Pinheiro Torres de Meirelles [1938-02-21/1965-06-03], em
rendição do anterior Cmdt, Capitão João Almeida. Em 04Set64, 6.ª feira, já
então na dependência do BART 645, e depois da chegada da CART 566, a CCAÇ 508
foi substituída no subsector de Bissorã pela CART 643, do antecedente ali
colocada em reforço, tendo seguido para o sector de Bissau, a fim de se
integrar no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações
da área, com um GrComb destacado em Quinhamel, ficando na dependência do BCAÇ
600.
No
início de Março de 1965, com dezoito meses já contabilizados no tempo da sua
comissão ultramarina, a Companhia do Capitão Francisco Meirelles foi de novo
transferida para uma zona operacional.
2.2
– SÍNTESE OPERACIONAL DO CAPITÃO MEIRELES DURANTE OS SEUS ÚLTIMOS TRÊS MESES
Recebida
a ordem para uma nova actividade operacional, agora no Leste, a CCAÇ 508
deslocou-se em 07 e 23Mar65, por grupos, para Bambadinca, por troca com a CCAÇ
526, onde aí ficou instalado o Comando da Companhia, assumindo este a
responsabilidade do respectivo subsector, com grupos de combate destacados em
Xime e Galomaro e ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 697, sediado
em Fá Mandinga, sob o comando do TCor Mário Serra Dias da Costa Campos.
Porém,
antes da sua chegada a Bambadinca, cujo sector passou a designar-se por «Sector
L1» a partir de 11Jan65, o BCAÇ 697, para desenvolver a intensa actividade
operacional, recorria às subunidades do sector e a outras que lhe eram
atribuídas como reforço, pois era constituída somente por Comando e CCS.
Uma
das primeiras acções planeadas pelo BCAÇ 697, do início de 1965, tinha por
objectivo a ocupação seguida da instalação de um aquartelamento na Ponta do
Inglês. Essa missão, baptizada de «Operação Farol», foi agendada para os dias
19 e 20Jan65, envolvendo forças da CCAÇ 526, CCAV 678 e Pel AMetr “Daimler”
809, onde, depois, ficou instalada a Companhia de Cavalaria para, a partir de
16Abr65, data em que foi criado o subsector do Xime, ficar reduzida a nível de
grupo de combate.
Durante
o decorrer desta operação, as NT foram emboscadas, no primeiro dia, pelos
guerrilheiros do PAIGC, tendo este sofrido algumas baixas não estimadas e onde
foi capturado algum material de guerra, nomeadamente granadas de mão e de RPG.
No dia seguinte, forças da CCAÇ 526 e CCAV 678, durante a sua actividade de
segurança à distância e por efeito de um reconhecimento na área da Ponta do
Inglês-Buruntoni, destruíram um acampamento IN com 15 casas a cerca de 600 mts
a sul da antiga tabanca da Ponta do Inglês, tendo capturado mais munições
diversas, onde foram encontrados alguns abrigos no lado sul da Ponta do
Inglês-Xime, no local da emboscada do dia anterior, onde foram destruídas mais
duas casas, a leste da Ponta do Inglês.
Em
16Abr65, com a criação do novo subsector do Xime, a CCAÇ 508 seria substituída
em Bambadinca pela CCAV 678 (que se encontrava na Ponta do Inglês),
deslocando-se, então, para o Xime, onde assumiu a responsabilidade deste
subsector, com GrComb destacados em Ponta do Inglês e Galomaro.
Em
20Abr65, quatro dias após a instalação do GrComb da CCAÇ 508 na Ponta do
Inglês, um GrComb de Paraquedistas (CCP 121), durante a «Operação Coelho» na
zona de Galo Corubal, destruiu 12 casas, abateu um guerrilheiro e fez dois
prisioneiros. Forças da CCAÇ 510, vindas do Xitole, destruíram várias casas na
região de Silibalde e apreenderam granadas de mão ofensivas e defensivas.
Uma
semana depois, em 03Jun65, na estrada Xime-Ponta do Inglês, na região de Ponta
Varela, a CCAÇ 508 tem mais quatro baixas em combate, sendo uma a do seu Cmdt,
o Capitão Francisco Meirelles, por efeito do rebentamento de uma mina “bailarina”.
Recordam-se
alguns antecedentes que marcaram este fatídico dia 03Jun65, 5.ª feira.
O
Capitão Francisco Meirelles fora incumbido de mostrar a uma equipa de enviados
especiais da RTP à Guiné – Afonso Silva (operador) e Luís Miranda (realizador)
– como se fazia a detecção de minas, muito frequentes naquela zona [Xime-Ponta
Varela], pois em menos de três meses tinham sido levantadas mais de 40. Perto
do meio-dia, a umas centenas de metros da tabanca de Ponta Varela, rebentou repentinamente
uma mina (“bailarina”) dando origem à morte do capitão Francisco Meirelles e de
mais três militares da CCAÇ 508. Os
operadores da RTP, que ficaram ilesos, começaram a filmar a cena poucos
momentos após a explosão, havendo um documentário fotográfico da operação e das
consequências do rebentamento. Parte dessa reportagem filmada foi transmitida
pela RTP em 16 de Setembro desse ano, como, aliás, já foi referido em
narrativas anteriores.
Na
madrugada de 04Jun65, os corpos foram levados para Bafatá, onde ficaram
sepultados o 1.º cabo [José Maria dos Santos Corbacho] e os soldados [Domingos
João de Oliveira Cardoso e Braima Turé], e onde um avião foi buscar o corpo do
Capitão Meirelles.
Trazido
para Bissau, ficou depositado na capela militar de Santa Luzia. No dia seguinte,
pelas 10 horas, houve missa de corpo presente, celebrada pelo Tenente-Capelão
Padre Nazário, finda a qual o cortejo fúnebre dirigiu-se para a capelinha do
cemitério onde o caixão permaneceu até ser removido para a Metrópole. Aqui
chegou no vapor «Manuel Alfredo» na madrugada de 18Jul65, precisamente quando
se perfazia um ano depois da partida para a Guiné (Op. Cit. pp10-11).
3.
- O CAPITÃO FRANCISCO MEIRELLES TEM O SEU
NOME NA TOPONÍMIA DA CIDADE DO PORTO, NA ZONA DA FOZ DO DOURO
Após
a chegada do seu corpo a Lisboa, o Governador Militar de Lisboa, General Amadeu
Buceta Martins quis tributar uma derradeira homenagem a quem foi seu
dedicadíssimo ajudante e ordenou que lhe fossem prestadas honras fúnebres, nas
quais se dignou tomar parte, assim como o Brigadeiro Couceiro Neto, 2.º
Comandante do Governo Militar de Lisboa. Até à 1 hora da madrugada do dia 19,
hora em que partiu para o Porto, houve turnos compostos por um oficial, um
sargento e quatro praças. Antes, havia sido celebrada missa, às 14 horas, pelo
capelão Padre José Maria Braula Reis (1922-), mandada dizer pela Direcção da
Arma de Infantaria, e às 19 horas missa celebrada pelo Ver. Padre Júlio Marinho
S. J., a pedido da família.
À
uma da manhã seguiu, então, o corpo do Capitão Meirelles num armão do Exército,
cedido pelo Quartel-General de Lisboa, em direcção ao Porto, onde na Igreja
paroquial da Foz do Douro houve missa de corpo presente celebrada pelo Padre
Fernando Leite S. J. que já presidira ao seu casamento. Lançou a absolvição
final o pároco da Freguesia, Padre Manuel Dias da Costa, que também presidira à
sua Profissão de Fé e que pronunciou algumas comovidas palavras ao ver na sua
Igreja Paroquial, antes de baixar à sepultura, quem, tantas vezes e tão
devotamente, a frequentava.
À
porta do cemitério do Prado do Repouso, situado na zona oriental da cidade do
Porto (foto 5; ao lado), uma companhia de atiradores deu as salvas do estilo e
outra companhia prestou a guarda de honra. E juntos ao jazigo de seus Bisavós,
ficou finalmente sepultado. […]
No
dia 20 de Julho de 1965, a Câmara Municipal do Porto, na sua reunião ordinária,
aprovou por unanimidade as intervenções que, a propósito do falecimento do
Capitão Francisco Meirelles, foram proferidas respectivamente pela vereadora
Senhora Dona Maria José Novais e pelo Senhor Presidente da Câmara.
Nesta
sessão pública e no uso da palavra, a vereadora enalteceu a memória do saudoso
e heroico Capitão Francisco Meirelles, por motivo da chegada do seu corpo à
Cidade do Porto e dos ofícios fúnebres, traduzidos numa grandiosa manifestação
de dor a que comovidos todos assistiram na Igreja paroquial de S. João Baptista
da Foz do Douro, associando-se a autarquia à dor daquela família. Ao lembrar o
Soldado Desconhecido, fez também questão de recordar com viva emoção, todos
quantos deram a vida para dignificar a farda, a Pátria e a Família.
Foi
promovido a tenente em 1 de Dezembro de 1962, sendo colocado, após o seu
regresso ao Continente, na Região de Tomar. Promovido a capitão em 16 de Junho
de 1964 foi novamente mobilizado, desta vez para a Guiné, para onde partiu com
outros camaradas a 17 Julho de 1964, no barco de carga «António Carlos».
Continuou
a vereadora: “Partiu, deixando sua mulher
e dois filhinhos de tenra idade [dois rapazes; um nascido em Abril/1963, o
outro em Junho/1964]. Foi nessas
longínquas paragens, que soube morrer aos vinte e sete anos, depois de ter sido
um magnífico exemplo das mais nobres virtudes morais e cristãs, a ponto de
generosamente sacrificar o amor da própria família, que sempre subordinou aos
altos interesses da Nação. […] Estas
palavras são um apelo à Nação; um apelo a todos nós; para que respeitando tanto
sacrifício saibamos honrar e merecer os nossos queridos mortos vivendo com
dignidade o momento que passa”.
Partindo
dos considerandos supra, a vereadora apresentou uma proposta/pedido dirigido ao
Presidente da Câmara solicitando “que a
digna Comissão de Toponímia, promovesse no sentido de dar o nome do heroico
Capitão Francisco Xavier Pinheiro Torres de Meirelles a uma das ruas ou praças
da Foz do Douro, para que ficasse a perpetuar a lembrança dos seus actos de
valentia”.
A
proposta foi aprovada por unanimidade, passando o «Largo de Cadouços» a
chamar-se, a partir de 1966, «Largo do Capitão Pinheiro Torres de Meirelles»,
conforme se dá conta nas duas imagens abaixo.
Sem comentários:
Enviar um comentário