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terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

P18: AS DUAS FACES DA GUERRA


Jornalista diz ter sido obrigada a repensar as
resistências interiores que tinha face à Guerra Colonial


João Antunes

Quando ainda está fresca na memória a série que Joaquim
Furtado apresentou na RTP, chega agora ao mercado "As duas faces da Guerra",
um trabalho assinado conjuntamente pela jornalista e documentarista
portuguesa Diana Andringa e pelo conceituado realizador guineense Flora
Gomes, um dos nomes de referência do cinema africano das duas últimas
décadas. Foi possível assim oferecer ao espectador uma visão sobre os dois
lados do conflito e alargar a capacidade de investigação iconográfica,
permitindo por exemplo mostrar ao mesmo tempo como dois sobreviventes
portugueses assistem de forma comovida, às imagens de um ataque mortal do
PAIGC, captadas por uma equipa francesa convidada pelos responsáveis
portugueses, e cenas inéditas de clandestinidade, nomeadamente acções de
formação do próprio Amílcar Cabral.

Foi precisamente esse aspecto que Diana Andringa nos
referiu, no lançamento para o mercado do DVD. "A grande vantagem foi ter
dois olhares que são complementares, mas diferentes em todo o caso. Conheço
melhor a parte portuguesa, o Flora conhece melhor a parte guineense. Ele
chega a pessoas a que eu tinha dificuldade em chegar". Mas o projecto também
tinha as suas armadilhas. "Apesar de tudo, eram duas sensibilidades
diferentes", admite Diana Andringa. "Talvez menos em termos de ser um
guineense e uma portuguesa, mas de uma ser documentarista e de o outro ser
da ficção".

Em Portugal, a Guerra Colonial está finalmente a deixar de
ser um certo tabu. Será que os guineenses têm a mesma relação com o passado
ou têm vontade de falar do assunto? "Têm muita vontade de falar", garante.

E será que, durante o processo, Diana Andringa aprendeu
algo de novo sobre esse período da nossa história recente? "Houve coisas que
me marcaram imenso. Uma delas foi a ausência de ódio, hoje em dia. De facto,
as pessoas têm uma relação fraternal, como se em vez de terem andado à
guerra uns com os outros tivessem andado à guerra juntos. Os de cá ficaram
apaixonados pela terra, pela Guiné e pelos guinéus, pelas pessoas. E lá não
há nenhum ódio aos portugueses".

Finalmente, Diana Andringa confessa que a realização deste
trabalho mudou algo na sua visão sobre a Guerra Colonial. "Antes, eu era do
lado dos que achava que se devia desertar. Fui sempre contra a Guerra
Colonial. Agora, percebi um bocado melhor os militares portugueses que eram
forçados a fazer uma guerra e o que acontece no terreno quando se está cheio
de medo."

A terminar, uma lição humanista, que tanto se pode
encontrar no belíssimo filme de Flora Gomes e Diana Andringa como nas
palavras com que a jornalista termina a conversa "O que é extraordinário é
que há uma espécie de fraternidade de armas entre ambos os lados. Há uma
espécie de turismo sentimental. Os militares portugueses que fizeram a
guerra na Guiné vão lá ver como é que estão as coisas e muitas vezes vão
para ver o seu anterior adversário e discutir. Isto é interessante".

Jornal de Notícias, 22 de Janeiro de 2008

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