MSG com data de: 03ABR2018 de Jorge Araújo
"Do outro lado do combate"
[ATAQUE A BEDANDA - PARTE II e última da série]
Para concluir o enquadramento e análise ao ataque ao
aquartelamento das NT em Bedanda, realizado em 25 de Outubro de 1969, anexo a
segunda (e última) parte.
Recordo que este ataque corresponde ao terceiro de um
"programa" de oito acções militares incluídas no "Plano de
Operações na Frente Sul", elaborado pelos responsáveis do PAIGC para serem
levados à prática durante o último trimestre de 1969 nas regiões de Quinara e
de Tombali.
Com um forte abraço de amizade.
Jorge Araújo.
Bedanda (Agosto de 1972) – O obus 14 e os
artilheiros do PArt. em acção perante um ataque do PAIGC (P13324-LG). Foto de
Vasco Santos (2011), com a devida vénia.
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Poste anterior da série, ataque a Bedanda PARTE I
“PLANO
DE OPERAÇÕES NA FRENTE SUL” [OUT-DEZ’69] - ATAQUE
A BEDANDA EM 25 DE OUTUBRO DE 1969 -
(AO TEMPO DA CCAÇ 6, 1967/1974)
1. -
INTRODUÇÃO
Com
a presente narrativa, a última de duas relacionadas com o ataque a Bedanda em
25 de Outubro de 1969, ocorrido treze dias após o primeiro, encerra-se a
análise à segunda missão do “plano de acções militares” do PAIGC, de um
“pacote” de nove – mais uma do que inicialmente pensado, uma vez que Buba seria
contemplada com outra flagelação “extra” devido aos fracassos registados por “Nino”
Vieira (1939-2009), e seus guerrilheiros, na primeira – todos eles previstos concretizar
durante o último trimestre desse ano, nas regiões de Quinara e de Tombali, contra
os diferentes aquartelamentos das NT, cujo calendário se recorda abaixo.
Para
a elaboração deste trabalho de pesquisa global, apresentado em fragmentos, continuaremos
a utilizar um documento base, que é o relatório “das operações militares na Frente Sul” [http://hdl.handle.net/11002/
fms_dc_40082 (2018-1-20)], localizado no Arquivo Amílcar Cabral, existente na Casa
Comum – Fundação Mário Soares, adicionando-lhe, sempre, outras informações de
diferentes fontes bibliográficas, como metodologia de caracterização e de
aprofundamento histórico.
2. – O
AQUARTELAMENTO DE BEDANDA E AS SUAS UNIDADES
Como foi referido no primeiro
fragmento do ataque a Bedanda [P338], os antecedentes históricos da CCAÇ 6 têm
a sua origem na estrutura orgânica da 4.ª CCAÇ (Companhia de Caçadores Nativos
[ou Indígenas], esta criada e instalada, primeiramente, em Bolama em finais de
1959. Quatro anos e meio depois, em Julho de 1964, mudou-se para Bedanda, por
necessidades operacionais, como resposta ao pedido de intervenção dos africanos
no esforço da guerra. Em 1 de Abril de 1967, decorridos três anos após a
instalação dos seus primeiros efectivos em Bedanda, esta Unidade foi renomeada,
passando a designa-ser por Companhia de Caçadores n.º 6 [CCAÇ 6 - “Onças
Negras”].
Um ano depois, em 10 de Junho de
1968, como reconhecimento da importante acção desenvolvida nas múltiplas
missões que lhe foram confiadas, a CCAÇ 6 viria a ser merecedora de uma
condecoração atribuída pelo Governo Central ao seu Estandarte [Cruz de Guerra
de 1.ª Classe], em cerimónia pública presidida pelo Chefe de Estado, Almirante
Américo Thomaz (1894/1987), de homenagem às Forças Armadas Portuguesas,
realizada no Terreiro do Paço, em Lisboa.
Recorda-se o texto que originou
a condecoração tornado público na comunicação social [DL, em 11 de Junho de
1968, p11; e DN, em 12 de Junho de 1968].
Para além da CCAÇ 6, o Aquartelemanto de Bedanda dispunha também de um Pelotão de Canhões sem Recuo [PCS/R], de um Pelotão de Artilharia «obus 14 mm» [PArt] e de um Pelotão de Milícias [PMil n.º 143] da etnia fula.
Bedanda (1970) – O obus 14 e os artilheiros do
PArt. (P7693-LG) – foto de Hugo Moura Ferreira (2006), com a devida vénia
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3. - O
ATAQUE A BEDANDA EM 24OUT1969… QUE PASSOU PARA 25OUT1969 DEVIDO A SUCESSIVAS
FALHAS NA SUA ORGANIZAÇÃO
Desenvolvimento da acção: (Conclusão)
No dia 24 de Outubro [de 1969],
às 17h15, as forças do Corpo Especial de Exército deviam atacar as instalações
militares do campo de Bedanda mas, devido ao número insuficiente de
transportadores não puderam concentrar no local toda a quantidade de munições
necessária e muito menos distribui-la a tempo para as 3 posições de fogo, razão
principal porque tiveram que adiar a missão.
No dia seguinte, com a aprovação
do Comandante do Corpo Especial de Exército (“Nino” Vieira), as forças de Artilharia
prontificaram-se a realizar a operação e a iniciá-la à mesma hora indicada para
o dia anterior [17h15]. Às 17h00 todas as peças estavam prontas para o tiro,
quando descobriram uma avaria na comunicação. Devido a esse imprevisto só meia
hora mais tarde iniciaram o fogo de enquadramento com uma peça de canhão 75,
desde a posição de fogo do “GRAD”. O inimigo [NT] respondeu imediatamente,
cortando a instalação em dois pontos. Só 15 minutos depois foi retomada a
direcção de tiro e deram por terminado o enquadramento para as [peças] GRAD [foguetes/foguetões
de 122 mm]. Imediatamente as peças de canhão abriram fogo, realizando tiro
indirecto desde a distância de 2.000 metros. Do posto de observação, pareceu (a
visibilidade, dada a hora já avançada da tarde, era deficiente) ser um tiro
efectivo, cobrindo a zona indicada.
Bedanda (Agosto de 1972) – O obus 14 e os
artilheiros do PArt. em acção perante um ataque do PAIGC (P13324-LG). Foto de
Vasco Santos (2011), com a devida vénia.
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Terminado o fogo dos canhões,
as peças do “GRAD” fizeram o seu primeiro disparo que, do posto de observação,
pelo clarão produzido, pareceu-nos ter atingido o objectivo. [Este disparo ficou
na história da guerra por ter sido o primeiro foguete 122 mm a ser lançado por
uma peça “GRAD” contra as NT]. Mais tarde, segundo os camaradas de infantaria
situados a poucas centenas de metros do objectivo, esse disparo caiu dentro do
objectivo. Deu-se a ordem de tiro de bataria e, salvo um foguete danificado,
foram lançados os restantes [cinco], os quais se dispersaram pela periferia do
objectivo.
Finalmente, os morteiros 82 iniciaram
fogo, da mesma posição de fogo dos canhões, realizando fogo rápido, mas
desordenado e sem muita afectividade, devido à impossibilidade de dirigir tiro
naquela altura (tinha anoitecido já completamente) pois haviam roto
[danificado] completamente as instalações telefónicas.
Citação:
(1963-1973), "Combatentes do PAIGC
deslocando uma peça de artilharia anticarro", CasaComum.org, Disponível
HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_
43753 (2018-2-12) (com a devida vénia)
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Conclusão
1. O tiro de
artilharia, no seu conjunto, não foi efectivo como esperávamos, especialmente
devido à falta de direcção continua e ordenada do tiro e isso motivado pelas
interrupções sistemáticas das instalações telefónicas.
2. Dada a
distribuição dos quarteis (com pequenas concentrações em 3 pontos), Bedanda não
é um objectivo muito favorável à utilização das [peças] “GRAD”. Prova-o o facto
do primeiro obus ter caído dentro do objectivo e os restantes terem-se
dispersado sem atingi-lo.
3. Com a
experiência herdada de B1, concluímos que a direcção de fogo feita com a
utilização de telefone não dá a mínima garantia. A introdução de rádios
impõe-se como uma necessidade urgente para que a realização dessas operações
tenham o mínimo de garantia e coordenação com os bi-grupos de infantaria.
4. Não é
recomendável a realização de tiro de enquadramento de noite. A observação e as
respectivas correcções são vagas e imprecisas.
5. O transporte de munições até aos pontos desejados é algo que deve ser
encarado com toda a responsabilidade e garantido contra quaisquer atrasos ou
imprevistos
Actuação da Infantaria
A infantaria deveria actuar
imediatamente depois do bombardeamento artilheiro.
Contava com os seguintes
efectivos assim distribuidos:
- 3 bi-grupos no quartel do
meio, com 5 bazookas RPG-7 (4 granadas cada)
- 2 bi-grupos no quartel de cima
(onde estão as lojas), com 2 RPG-7 (4 granadas cada)
A acção da infantaria, prevista
para as 17h45 (a operação devia ter início às 17h15) só foi possível 3 horas
mais tarde, devido à reacção do inimigo [NT], que abandonou os quarteis,
refugiando-se no mato, contra o intenso, embora não muito efectivo, fogo da
artilharia. Três horas depois, quando o inimigo [NT] regressava aos quarteis,
foi completamente surpreendido com fogo de bazookas (21 RPG-7) e outras armas
de infantaria. Sofreu grande número de baixas, que, segundo informações
posteriores, ultrapassou os 30 [trinta].
A retirada foi sem problemas,
pois o canhão inimigo [NT] e sua dotação foram destruídos pelo primeiro foguete
do “GRAD”.
Correcção às informações obtidas posteriormente pelo PAIGC:
De acordo com a base de dados
existente na Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra (sítio:
http://apvg.pt), relativa ao número de militares – continentais e de
recrutamento local – falecidos nos TO ultramarinos, verificou-se que durante o
período em que a Companhia de Caçadores n.º 6 (CCAÇ 6) prestou serviço em
Bedanda [de 01Abr1967 a 27Abr1974 = sete anos] o número total de baixas foi de
12 (doze), sendo 10 (dez) do Recrutamento Local e 2 (duas) do Contingente
Metropolitano.
Das 10 (dez) baixas de naturais
da Guiné, 5 (cinco) morreram em combate (50%), 3 (três) por acidente (30%), 1
(um) por doença (10%) e 1 (um) por afogamento (10%).
Para que conste, foi elaborado o
competente quadro nominal.
Pelo acima exposto, conclui-se
que as informações obtidas por parte do PAIGC, quanto ao número de mortos
durante esta acção, carecem de fundamento (são absolutamente falsas), na medida
em que este seu ataque não provocou qualquer baixa mortal.
Por outro lado, desde o início
do conflito [1963] e até à alteração do nome para CCAÇ 6 [1967], a 4.ª CCAÇ
contabilizou 15 (quinze) baixas, sendo 5 (cinco) do Contigente Metropolitano e 10
(dez) do Recrutamento Local.
Seguindo o mesmo procedimento
anterior, apresenta-se o respectivo quadro nominal.
Continuaremos a desenvolver este tema com a apresentação dos
principais factos ocorridos em cada um dos restantes ataques.
Com
forte abraço de amizade,
Jorge
Araújo.
03ABR2018.
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